Discurso por ocasião do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas
Angra do Heroísmo, 10 de junho de 2025
Caros Açorianos,
- No corrente ano temos a feliz coincidência de ter comemorado ontem, 9 de junho, na cidade da Praia da Vitória o Dia da Região e de hoje, 10 de junho, comemorarmos na cidade de Angra do Heroísmo, o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.
São duas datas festivas que se completam e que refletem o orgulho dos Açorianos na sua terra, no seu passado, na sua identidade própria e na sua luta, pelo bem e pelo progresso das suas gentes, que há 49 anos têm vindo a travar no quadro da autonomia política da Região.
Mas também, o orgulho na sua pertença a Portugal, num passado de 9 séculos, nas suas raízes familiares, na sua cultura e na sua língua, onde se revêm e se inspiram.
O vosso orgulho é também o meu orgulho, após 14 anos de viver nesta maravilhosa terra e de ter tido a honra de vos ter servido com toda a minha dedicação e também, posso com sinceridade dizer, com todo o meu amor.
Procurei ajudar, com simplicidade e humildade, mas com o sentido de responsabilidade e a consciência da dignidade e do prestígio institucional das minhas funções.
Acabo de entrar no último ano do meu presente mandato e quero desde já agradecer o acolhimento amigo e carinhoso que me foi feito sentir, a mim e à minha mulher, como parte da grande família açoriana, que é hoje também a nossa.
Procurei sempre respeitar a maneira de ser própria dos açorianos, o seu modo de viver, apreciando a extraordinária literatura, as expressões culturais e a queda para a música, reveladoras do seu carácter e sensibilidade.
Temos a felicidade de viver num regime democrático, numa sociedade livre, em que prevalece o primado do direito e o respeito pelas liberdades individuais e pelos direitos humanos, que reconhece a todos a mesma igualdade de direitos, procurando proporcionar a todos as mesmas oportunidades, procurando diminuir as desigualdades e assegurar a justiça social.
Uma sociedade que se caracteriza pela fraternidade e tolerância recíproca e por uma coesão social que se reflete na tranquilidade do quotidiano, a que não é estranha a tão forte e benéfica influência cristã na vida da maioria dos açorianos.
As instituições políticas e administrativas na Região funcionam com normalidade, civilidade e harmonia num quadro do sistema democrático aberto à participação dos cidadãos.
Desde que assumi as minhas funções em 2011 os diversos atos eleitorais que tiveram lugar decorreram sempre numa atmosfera pacífica e ordeira.
Assisti a uma alternância de poderes, tida e aceite como normal, num exemplo de maturidade cívica e política.
Mantive sempre com os órgãos de poder próprio da Região uma relação correta, cordial e cooperante.
Sempre reconheci a sua primazia, e enfatizo este ponto, no que respeita à sua representatividade do povo açoriano, legitimada pela escolha livre dos eleitores, expressa pelo seu voto.
Procurei nunca interferir no exercício das suas competências e responsabilidades, dentro do princípio autonómico de autogoverno, consagrado na Constituição.
Evitei sempre criticar ou comentar as suas opções políticas ou a expressão das suas opiniões.
Apoiei sempre o regime de autonomia que tem constituído uma força motriz do desenvolvimento e trazido aos açorianos confiança em si próprios e no seu futuro.
A autonomia faz no próximo ano 50 anos e, como todos reconhecemos, é extraordinária a transformação dos Açores nesse período.
Permitam-me que expresse a minha convicção de que a Unidade do Estado e a Autonomia da Região coexistem e são perfeitamente conciliáveis. São como o corpo e a alma, existem conjuntamente e completam-se mutuamente.
Baseiam-se em princípios que não são questionados e que são, em ambos os níveis, geradores de estabilidade e confiança, mobilizadores de energias e congregadores de esforços comuns e solidários.
Quanto ao exercício das minhas responsabilidades, estatuídas na Constituição, procurei sempre que ele fosse prudente e ponderado, salvaguardando os interesses do País e da Região.
Nunca deixei de ouvir a voz dos açorianos e nunca deixei de consultar os órgãos de poder regionais e procurei sempre favorecer e advogar os interesses da Região, convencido que estava assim a favorecer os interesses do país no seu todo.
Sempre pugnei para que sejam reforçados, em termos efetivos, o diálogo e a consulta mútua entre o Governo Regional e o Governo da República, não só para a consecução dos interesses da Região, mas também para a definição das políticas nacionais, para que sejam ouvidas e equacionadas as posições da Região e cada uma das partes possa assumir as suas responsabilidades dentro dos princípios da solidariedade e da cooperação.
A este respeito, uma participação do Presidente do Governo Regional em reuniões do Conselho de Ministros, com uma regularidade pré-estabelecida, seria, na minha opinião, um passo na boa direção.
Salientaria ainda que as questões relativas ao mar e às finanças regionais bem como as áreas da segurança e defesa, postas em relevo pelo atual contexto internacional, destacam-se entre as que merecem uma atenção conjunta muito particular.
Permitam-me que destaque o facto de os Açores se terem colocado na vanguarda, podemos dizer, a nível mundial, na sua estratégia e nos seus esforços de assumirem uma posição pioneira e corajosa no estabelecimento de áreas marinhas protegidas, dando um exemplo que tem sido aplaudido universalmente.
Apesar de todas as incertezas de um mundo em turbulência, olho para os Açores com otimismo e esperança.
Continua a ser uma terra muito especial, onde é bom viver, que vem prosseguindo o seu caminho, com estabilidade e segurança, melhorando progressivamente a qualidade de vida e o crescimento económico e com significativas potencialidades para um futuro mais próspero e para que possa ter lugar a superação de alguns persistentes problemas sociais ainda por resolver.
- Falar-vos-ei seguidamente de um tema – a paz e a guerra – que infelizmente se encontra na ordem do dia, cuja relevância para as nossas vidas não podemos ignorar e da qual devemos ter consciência com base na realidade factual, muitas vezes deturpada por campanhas de propaganda e desinformação.
O destino de Portugal está ligado ao futuro da Europa e o futuro da Europa está em jogo na Ucrânia.
A nova realidade geopolítica, dominada pelas relações de poder entre as grandes potências, as incertezas daí derivadas e a forma como a Europa responder à crise existencial com que se defronta, terão um impacto nos Açores e no futuro papel da Região.
É uma matéria que não podemos menorizar e que irá obrigar os nossos governantes, nacionais e regionais, a traçar uma estratégia que por um lado valorize o possível papel dos Açores e, por outro lado, evite que ele fique dependente de decisões tomadas por terceiros à nossa revelia.
O tema da Paz e da Guerra é um tema incontornável para todos nós onde quer que vivamos.
A todos nos afeta e ninguém se pode alhear dele.
A guerra é um flagelo horrível e um verdadeiro retrocesso civilizacional.
A guerra é o inferno na Terra … sem sentido, intolerável, insuportável.
Para citar Sua Santidade o Papa Francisco, “a guerra é um absurdo e é sempre uma derrota”.
E, no entanto, tem sido, e infelizmente continua a ser, uma constante na História da Humanidade.
Durante os meus primeiros anos de vida, a Europa e o Mundo atravessaram, com a 2.ª Guerra Mundial, os anos mais negros e trágicos da sua História Moderna, com dezenas de milhões de mortos, uma destruição em larga escala e um sofrimento humano atroz. Os mais horrendos crimes. Uma monstruosidade.
Muito embora sofrendo os efeitos da guerra, Portugal manteve-se afastado dos teatros de operações.
Com a ajuda militar massiva dos EUA, os países aliados acabaram por sair vencedores de uma guerra, cujo fim não podia ter sido outro senão a rendição total da Alemanha nazi e da clique militar do Japão e a derrota das suas políticas expansionistas.
Terminada a guerra, o mundo procurou paulatinamente construir uma nova ordem política internacional, assente na Organização das Nações Unidas, com o objetivo primordial de garantir a manutenção da paz e segurança internacional, com base no Direito Internacional.
Como se diz no preâmbulo da Carta pretendia-se que as futuras gerações nunca mais viessem a sofrer o flagelo da guerra.
Mas o fim da guerra veio desafortunadamente mostrar a política ditatorial e imperialista de Estaline, procurando a expansão da influência e domínio da União Soviética, absorvendo na sua órbita os países da Europa do Leste nos quais impôs regimes satélites comunistas, obedientes a Moscovo. Um regime soviético, totalitário e repressivo, que suprimiu todas as liberdades e sujeitou a população a uma degradante humilhação e causou a morte a milhões dos seus cidadãos condenados aos horrores do Goulag.
Esta situação deu origem ao período da “Guerra Fria” e à divisão da Europa pela assim designada “Cortina de Ferro”, separando os países democráticos com economias de mercado dos países comunistas com economias planificadas pelo Estado.
A ameaça soviética levou os países ocidentais, liderados pelos EUA, à criação de uma aliança político-militar de carácter defensivo, a NATO, com o objetivo de assegurar a dissuasão de qualquer ataque militar e a defesa coletiva dos estados membros e assim garantir uma estabilidade e segurança que permitisse à Europa Ocidental desenvolver-se em paz e construir uma zona de prosperidade e justiça social em que prevalecesse o primado do direito, a democracia, os direitos humanos e as liberdades fundamentais.
Os 40 anos que se seguiram à formação da NATO e até à queda do muro de Berlim, foram anos de paz em que esta organização não disparou um único tiro, nem houve qualquer operação militar envolvendo a União Soviética, nem sequer em situações que a poderiam justificar como as intervenções soviéticas na Hungria em 1956 e na Checoslováquia em 1968. Nunca foi propósito da NATO alterar o “status quo” existente através de ações armadas por ela desencadeadas.
O projeto europeu, inicialmente com propósitos de ordem económica, aberto a novos países dispostos a abraçar os ideais democráticos, pôde assim desenvolver-se, alargando a sua esfera geográfica no Continente Europeu e aprofundando a sua esfera de ação, tornando-se no que é hoje a União Europeia, com os seus atuais 27 membros, à qual temos a felicidade de pertencer há já 4 décadas.
Em 1989, deu-se a queda do muro de Berlim, que desencadeou, em cascata, a reunificação da Alemanha, o colapso e desintegração da União Soviética, a dissolução do Pacto de Varsóvia e a independência dos países da Europa do Leste, que deixaram de estar sob o jugo soviético. A nova situação veio transformar o mundo e alterar o contexto geopolítico e a ordem internacional. Uma nova esperança despontava. Houve quem previsse o fim da História, a paz perpétua.
Tudo isto sucedeu sem recurso à força das armas, mas sim como consequência de um movimento espontâneo das populações, ansiosas por uma independência, tantos anos reprimida.
Foi o apelo da liberdade e da democracia que levou à rejeição da ditadura comunista e à independência dos países da Europa central e posteriormente ao seu desejo de aderirem à UE e à NATO.
Foi um processo longo, feito prudentemente em sucessivas etapas, não tendo sido pensado como resposta a uma ameaça militar, nem teve como propósito pôr em causa ou diminuir a segurança da Rússia.
Com efeito, a UE e a NATO preparavam-se para reformar as suas forças armadas que deveriam ser mais reduzidas, profissionalizadas e estar preparadas para ações limitadas respondendo a ameaças fora do teatro da Europa, para além da estabilização dos Balcãs.
Os objetivos da NATO, que no período da Guerra Fria visavam conter o poder militar soviético, passaram a ser apoiar a democratização da Rússia e promover a sua associação e possivelmente a sua integração nas estruturas de segurança europeias.
Os países ocidentais olhavam para o fim da Guerra Fria numa perspetiva dos valores da liberdade e da democracia, como um avanço civilizacional. Foi a força desses valores que prevaleceu ao fim de 40 anos e que verdadeiramente derrubou o muro de Berlim. Pensávamos no Ocidente, que o espectro da guerra na Europa estava finalmente afastado, que todos os eventuais diferendos se poderiam resolver sem recurso à força, que a diplomacia e o diálogo sob a égide das Nações Unidas tudo poderiam reparar, que poderia haver um entendimento com a Rússia e que esta poderia vir a integrar-se numa Europa aberta e beneficiar da prosperidade que a UE estava a construir.
Mas a política externa da Rússia entrou num processo de transição e estava longe de uma definição clara das suas linhas de atuação.
O longo processo de alargamento foi sempre objeto de um diálogo com a Rússia. Assentou no princípio consignado na Ata Final de Helsínquia de que deve ser deixado aos países as escolhas das suas alianças. O alargamento teve a aceitação pelo Presidente Yeltsin, expressa, primeiro na sua visita a Varsóvia, em agosto de 1993 e mais tarde na cimeira entre os EUA e a Rússia, em Helsínquia, em 1997.
O acesso de Putin ao poder, em 1999, 10 anos depois da queda do muro de Berlim, veio constituir um fator novo e decisivo no que respeita às políticas da Rússia e às suas relações com o Ocidente.
A sua perspetiva da realidade revelou-se como bem diferente da perspetiva ocidental, ao mesmo tempo que o regime político na Rússia evoluía para uma ditadura pessoal.
Putin acusou Gorbatchov de ter traído a Rússia e ter conduzido a União Soviética ao colapso.
A sua visão, baseada na lógica do poder e no seu desejo de reconstituir o império dos Czares, viu a dissolução da União Soviética como o maior erro geoestratégico do século XX, como uma aberração histórica, como um atentado contra o destino sagrado da Rússia, como uma conspiração dos EUA através da NATO, para enfraquecer a Rússia e dominar o mundo como única potência mundial, como uma ameaça permanente de um cerco capitalista, antagónico e russofóbico.
Entre juntar-se à nova Europa, unida e livre, baseada na paz, na defesa dos direitos humanos, na inovação, na educação, no conhecimento científico e na prosperidade, Putin optou pelo sonho de um império baseado na hegemonia e na agressão.
A uma Rússia benigna, orgulhosa das suas contribuições para a Humanidade, dos seus génios da literatura, da arte, da música, o Presidente Putin preferiu uma Rússia expansionista, militarista, predadora.
No dia 24 de fevereiro de 2022, com o pretexto falacioso de que uma aproximação da Ucrânia com o mundo ocidental constituía uma ameaça à segurança da Rússia, o Kremlin desencadeou, em flagrante violação do Direito Internacional e da Carta das Nações Unidas, uma invasão em grande escala da Ucrânia.
Agressão brutal, não provocada, premeditada e sem justificação, negando à Ucrânia o direito de existir como nação independente e livre e negando o seu direito de escolher as suas instituições e as suas alianças. A Ucrânia era considerada por Putin como fazendo parte da Rússia, que tinha o dever sagrado de a libertar.
Na verdade, o que Putin teme e não tolera é o avanço da liberdade e da democracia e a prosperidade da UE às suas portas. É isso que ameaça o seu regime de ditadura, os seus planos expansionistas e militaristas e a sua própria sobrevivência.
O regresso da guerra à Europa veio ditar o colapso da ordem internacional pacientemente construída, desde o fim da 2ª Guerra Mundial e a impotência das Nações Unidas perante o sistemático veto no Conselho de Segurança por um dos seus membros permanentes. O mundo mudava de novo.
À força da razão e do direito sucedia a razão da força e da intimidação. É a prevalência da geopolítica como pretexto para a guerra.
Passados mais de 3 anos a guerra continua e não sabemos quando e como terminará.
Temos, todavia, consciência de que o mundo será outro e que a ordem internacional a nível europeu e global será certamente muito diferente e que a nova ordem resultará da forma como terminar o conflito da Ucrânia.
A paz na Europa deixou, infelizmente, de ser tida como um facto adquirido.
Os países da UE e da NATO cedo se aperceberam, logo após a invasão da Ucrânia, que o futuro da Europa estava em jogo e que era imperativo que todos se unissem no apoio ao direito de legitima defesa da Ucrânia, de forma a que a Rússia fosse confrontada com uma resposta firme e decidida que a penalizasse e a isolasse e que lhe fizesse sentir o elevadíssimo custo de uma guerra não provocada.
- A solidez e a unidade dos países democráticos, que então emergiu e que levou à adesão à NATO da Finlândia e da Suécia, foram postas em causa com a política externa da nova Administração americana, liderada pelo Presidente Trump.
Encontramo-nos hoje perante uma situação de grande incerteza e imprevisibilidade.
A UE não tem outra alternativa, perante as suas presentes vulnerabilidades e insuficiências e a atitude americana, senão reforçar a sua capacidade de defesa coletiva e dotar-se dos meios necessários para assegurar por si a sua autonomia estratégica, aumentando o seu potencial militar, mas também a sua segurança económica e o seu poder político.
Necessita para isso de lideranças fortes e de uma unidade firme e que os seus membros demonstrem determinação em agirem prontamente quanto aos indispensáveis aumentos exponenciais dos seus investimentos na defesa.
A UE deve continuar a ser um quadro de referência quanto aos valores fundamentais da liberdade e democracia que cimentam e dão coesão às suas sociedades e firmeza à sua unidade.
É importante que a UE procure coligações junto de países terceiros, sobretudo daqueles que comunguem com os seus ideais democráticos.
É importante também que procure assegurar que seja preservado o papel e a força da NATO e tanto quanto possível a colaboração dos EUA, cuja falta seria muito difícil de colmatar a curto prazo.
Mas o pilar europeu da NATO terá de ser dotado de uma autonomia militar e de uma capacidade própria de dissuasão adequada e credível.
Tudo isto terá de ser acompanhado com uma política de integração ao nível da UE das indústrias de defesa, da organização das forças armadas e do desenvolvimento e investigação científica e tecnológica, de que resulte uma participação de todos os países membros na produção dos equipamentos e material de defesa e nos respetivos benefícios, numa base equitativa. Será porventura uma boa oportunidade para a UE ultrapassar o período de estagnação em que se encontra. Precisa de um novo impulso e de um novo fulgor.
No fundo, cada vez mais se vão desenhando os contornos de uma tendência na UE para um “federalismo pragmático”, tomando as palavras de Mário Draghi.
O mundo está a mudar e a Europa também.
Entretanto, será preciso deixar bem claro que os esforços para se alcançar uma paz justa e duradoura na Ucrânia deverão continuar a ser uma prioridade em que nos devemos todos empenhar.
Mas tais esforços não deverão fazer esmorecer o apoio à Ucrânia que deve continuar a ser dado, no nível máximo, de modo a manter e, se possível, reforçar a sua capacidade de defesa contra a agressão de que continua a ser impiedosamente alvo.
- Toda esta problemática da paz e da guerra tem um forte impacto na política externa do nosso país e na importância estratégica e papel dos Açores na segurança do Atlântico Norte, que no contexto atual ganha um relevo especial.
A posição de Portugal tem sido clara de apoio à Ucrânia e à unidade da UE quanto ao reforço das suas capacidades de defesa.
Clara do ponto de vista moral no que respeita à defesa dos valores da liberdade e da democracia, bem como do Direito Internacional e da Carta das Nações Unidas.
Clara, igualmente, do ponto de vista político, no que respeita à fidelidade à UE e às nossas alianças e à cooperação com os nossos parceiros e aliados.
Os vetores da nossa política externa estão, hoje, bem definidos e merecem o apoio dos mais importantes partidos políticos e da esmagadora maioria dos portugueses: a União Europeia, principal garantia do nosso futuro, a CPLP, a NATO e a relação transatlântica, e a abertura ao mundo, esta última reforçada por laços históricos seculares com muitos países e uma importante diáspora.
São vetores simples e claros dos quais resulta uma estabilidade e uma previsibilidade que só podem favorecer a nossa imagem internacional, a nossa capacidade de ação e a relevância do nosso papel nas organizações internacionais.
É este “mix”, cuja cúpula deverá ser a UE, que temos de valorizar com a nossa criatividade, reforçando os nossos laços e as potencialidades de cada um dos seus vetores.
E devemos fazê-lo com convicção e autoconfiança, seguros de que temos os atributos requeridos e um papel relevante a desempenhar.
Nenhum país e ninguém está imune aos efeitos de um contexto altamente insalubre e perigoso que nos coloca a todos em face de novos desafios, perante os quais não nos podemos quedar passivos.
É altura de olharmos para nós próprios, para a nossa sociedade e instituições, para as nossas alianças e para as relações com os países mais próximos de nós, por razões ligadas a uma história comum ou por afinidades afetivas, culturais, políticas e económicas, mas também irmanados no respeito e na defesa do Direito Internacional e de valores comuns que salvaguardam a dignidade humana, a liberdade e a democracia.
Não podemos deixar de acreditar nos nossos valores e na esperança de que é possível fortalecê-los e fortalecer as nossas instituições que os preservam e asseguram.
Somos um país com uma longa História que nos levou aos 4 cantos do mundo, que nos deu uma visão humanista e uma tolerância e aceitação da diversidade cultural da Humanidade e que moldou o caráter e atitudes do nosso povo.
Espalhámos a fé Cristã e a língua portuguesa, hoje com uma dimensão global falada por mais de 250 milhões de pessoas em 4 continentes.
Com o 25 de abril e a adesão às CE tornámo-nos no que somos hoje. Um país com uma democracia parlamentar, pluralista, em que prevalece o primado do direito, a separação de poderes, o respeito pelas liberdades individuais.
Temos uma boa reputação internacional e somos respeitados e respeitamos os nossos parceiros. Portugueses ocupam as mais altas posições em organizações internacionais e ganhámos as eleições para o CS, as mais importantes e disputadas das NU, em 1996 e novamente em 2010, contra países bem mais poderosos do que o nosso, a Austrália e o Canadá.
É importante que mantenhamos um ânimo forte, a força moral e uma coesão nacional firme. O nosso apoio à UE e à sua unidade e coesão é da mesma forma importante e nele assenta a garantia do nosso futuro coletivo, pelo qual temos de lutar sem desfalecimento.
Caso contrário, citando o grande poeta Camões, no final do Canto X dos Lusíadas, corremos o risco de cair novamente numa “austera, apagada e vil tristeza”.
- Relativamente aos Açores, o novo contexto e as novas ameaças, vêm pôr em foco a importância estratégica do arquipélago e o seu papel relativo à segurança internacional e será, na minha opinião, oportuno que estas questões sejam objeto de uma atenção especial por parte dos Governos Nacional e Regional e de um novo olhar por parte de Portugal e dos seus aliados da NATO e da UE.
É absolutamente essencial e temos um interesse comum partilhado com os nossos aliados, que o Atlântico, especialmente o Atlântico Norte, continue a ser um espaço seguro para a navegação transatlântica e para o tráfego aéreo, mas também para as transmissões digitais que ligam os dois lados do oceano por cabos submarinos, altamente sensíveis.
A relação dos Açores com os EUA é particularmente importante, relação essa reforçada pela existência de um Acordo de Cooperação e Defesa e pela Base das Lajes, que tem constituído um apoio precioso para os interesses americanos em várias situações de crise aguda. Isto para além da importante diáspora açoriana nos EUA.
Os Açores constituem porventura o elo mais relevante na relação bilateral entre os nossos dois países e devemos tudo fazer para que assim continue, com os Açores a permanecerem um fator de aproximação e valorização de uma cooperação mútua que só pode ser do nosso interesse e vantajosa para os dois lados.
É essencial que possamos reforçar a vigilância de uma extensíssima zona marítima com a cooperação americana e que tenhamos uma presença que seja afirmação da nossa soberania.
Necessitamos por isso de infraestruturas modernas e adequadas e de recursos humanos qualificados para que possamos desempenhar as nossas responsabilidades.
As circunstâncias justificam que seja ponderado o reforço das referidas infraestruturas e dos meios militares na Região, não só da Marinha e da Força Aérea, mas também do Exército, que dê eficácia e credibilidade aos nossos esforços.
Devemos ao mesmo tempo desenvolver diligências diplomáticas para que a NATO e a UE se possam constituir parceiros do nosso esforço, para que nos providenciem uma cooperação no desempenho das nossas missões, do interesse de todos.
Iniciativas como o “Atlantic Center” que visa congregar os países ribeirinhos do Atlântico numa cooperação Norte-Sul e Sul-Norte devem ser apoiadas com o maior vigor. Países como o Canadá que ainda não são membros, mas que consideram positivamente essa possibilidade devem ser encorajados quanto ao interesse comum em que a sua adesão se concretize.
Por outro lado, a transferência do “Atlantic Center” para a Ilha Terceira, aliás prevista, mas ainda não materializada, deve avançar, para que lhe seja dado um novo impulso que se afigura bem necessário.
Uma palavra sobre o espaço, em que os Açores já têm um importante papel, com a escolha de Santa Maria para a Agência Portuguesa do Espaço, deve ser uma área que os Governos Nacional e Regional devem privilegiar, como estão aliás a fazer.
Ainda recentemente foi constituído um consórcio entre três das maiores empresas europeias na área da defesa – Thales, Airbus e Leonardo – para competirem com a empresa americana de Elon Musk, a SpaceX, para lançamento de foguetões e colocação de satélites no espaço.
Seria bom trazer o novo consórcio para Santa Maria, segundo me dizem, um dos locais mais vantajosos para os lançamentos em causa e para ali manterem atividades conexas, de alto nível tecnológico e científico.
Não podemos perder nenhuma oportunidade para fazer avançar os Açores em áreas de grande interesse e impacto no nível da economia e desenvolvimento da Região.
- Umas palavras finais para dar eco às palavras de Sua Santidade o Papa Leão XIV de que tudo devemos fazer para construir um novo mundo em paz.
Não podemos desistir.
Temos que nos unir, dar um papel à UE, reforçar o nosso ânimo e a clareza das nossas posições morais, mantermo-nos firmes na defesa dos nossos princípios básicos e dos nossos valores políticos e culturais e concretizar em ações concretas a fraternidade e solidariedade que nos deve ligar uns aos outros. Em paz.
Devemos obviamente garantir a nossa segurança e a defesa dos nossos países, mas, as relações entre estados deverão basear-se nos princípios de uma convivência pacifica e de cooperação internacional, devendo todas as controvérsias ou situações internacionais que possam levar a uma perturbação da paz, ser dirimidas por meios pacíficos no quadro da Carta das Nações Unidas.
O mundo não pode tornar-se numa corrida descomedida ao armamento à espera do próximo ataque, da próxima agressão.
Temos que fazer o nosso melhor para o evitar.
Desde já, alcançar uma paz justa e duradoura na Ucrânia, em Gaza, no Sudão, em todo o mundo.
Para o bem da Humanidade.
Para o bem de Portugal.
Para o bem dos Açores.
- O mesmo bem dos Açores para o qual tanto têm contribuído os nossos homenageados de hoje, com o seu exemplo de cidadania e de respeito para com os outros e a comunidade em que se inserem, ao longo de toda uma vida de trabalho.
Homenageados que irão de seguida receber as suas condecorações, como é tradicional nesta ocasião, mas que faço questão de nomear pessoalmente:
Dr. Gualter José Andrade Furtado
Engª Ilda Maria Pereira Leite Almeida Braz
Dr. Vasco Manuel Pimentel Pereira da Costa
Dr. José de Almeida Mello
Passo, pois, a palavra ao meu ilustre Chefe de Gabinete, Senhor Coronel Costa Coelho.
Bem hajam todos!
Angra do Heroísmo, 10 de junho de 2025
Pedro Catarino